O espetáculo Shopping and Fucking, texto de Mark Ravenhill, direção de Fernando Guerreiro, que está em cartaz no Teatro Molière, Aliança Francesa, de sexta a domingo, é uma crítica severa ao mundo capitalista e globalizado, onde os laços pessoais e afetivos são equiparados a mercadorias de compra e venda.
O texto dá ênfase à uma juventude amoral, destroçada e sem perspectiva, que sem nenhuma ideologia ou questionamento político e social, refugia-se nas drogas, no sexo, nas compras, na música tecno, para tentar sobreviver a um mundo cruel, onde a incerteza sobre o futuro é uma constante e a violência está em toda parte, nos lares e nas ruas, inclusive nas relações amorosas.
Neste panorama, onde a satisfação básica dos instintos é o que conta, vale se prostituir, traficar ou ficar indiferente ao sofrimento do outro. E são esses seres anestesiados, produto descartável de um sistema econômico perverso que Ravenhill quer destacar no texto que instiga pela crítica social e humor cáustico. Apesar de rejeitar o título de teatro político convencional, o discurso de Ravenhill é quase sempre político, comprometido com a realidade.
VERSATILIDADE - O diretor Fernando Guerreiro, que tem provado talento tanto em comédia (Vixe Maria! Deus e o Diabo na Bahia) quanto no drama (Um Bonde Chamado Desejo) costura bem todas as cenas do espetáculo, mostrando as cenas ousadas de homossexualismo com o vigor que o texto exige. É dele, também, a concepção do criativo cenário (executado por Euro Pires) que utiliza um carro, símbolo máximo do consumismo e tecnologia, para discutir as relações afetivas como mercadorias.
O elenco, integrado por Celso Jr (Budro), Jussilene Santana (Os Amantes), Edvard Passos (Raul Seixas - A Metamorfose Ambulante), Emiliano D'Ávila ( Sábado, Domingo e Segunda) e Rodrigo Frota ( Fogo Possesso) se entrega, sem reservas, ao jogo cênico, mas há destaques evidentes em algumas atuações.
A começar por Celso Jr, que tem uma atuação brilhante, iluminando todas as cenas que aparece como um personagem que representa bem a lógica da estrutura capitalista selvagem. Celso constrói Brian, com sutilezas de gestos e expressões, mastigando bem as intenções do texto. Nenhum ato seu é sem propósito. O intérprete também assina a trilha sonora e não decepciona.
TALENTO - A atriz Jussilene Santana, intérprete que cada vez mais se firma na cena teatral pelo talento, também constrói muito bem a personagem Lulu, com uma vivacidade e ritmo que funciona muito no epetáculo.
Outro bom destaque é Emiliano D'Ávila, jovem ator que representa muito bem Gary, garoto que quer ser propriedade de alguém após ser currado pelo padrasto. Uma promessa para o teatro baiano que só o tempo e outras interpretações poderão confirmar.
Rodrigo Frota ( Robbie) e Edvard Passos ( Mark), que, na trama, vivem um triângulo com Lulu ( Jussilene Santana) não são tão convincentes na construção de seus personagens, mas têm bons momentos em cena.
Edvard Passos, como o personagem Mark, o mesmo quer se livrar das drogas e procura evitar o amor, cresce na metade do espetáculo. O padrão vocal não é bom. Já Rodrigo Frota, como Robbie, poderia ser melhor se abandonasse uma certa infantilidade que empresta ao papel. A iluminação de Fábio Espírito Santo é funcional. O figurino é belo, mas para seres tão devassados poderia ser mais representativo. A produção, elogiável, é de Mário Dias.
Eduarda Uzêda
Jornal A Tarde
euzeda@grupoatarde.com.br
Um comentário:
Eu saí da peça com muitas questões.
A primeira delas é porque montar um texto como este em salvador, esta realidade é nossa? mas a peça é muito boa. e consegui mergulhar na vida dos atores. Me senti desconfortável do meio para o fim. é muito forte as cenas. gostaria de assistr novamente. achei muito bom o carro no palco. coimo vcs conseguiram botar lá?
Heliom Marques Silva
1o. semestree de PP
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