Uma fotografia hiperrealista. Da grande parte da juventude contemporânea, mais capitalista do que nunca, para quem tudo se resume ao paraíso artificial das drogas, da grife dos shoppings e do sexo vendido/comprado. Cintilações cínicas é o que nos desperta a montagem “Shopping and FUcking”, escrita pelo inglês Mark Ravenhill e primorosamente dirigida por Fernando Guerreiro: repugnância, medo e... atração. Atração pelo abismo do nada.
Um grupo de jovens é posto em cena, com seus erros e até belezas interiores. Dois rapazes e uma moça, que se amam atrapalhadamente. A moça é Jussilene Santana, Lulu, um show de beleza e talento, a se entronizar definitivamente como uma atriz baiana de primeiríssima linha. A melhor no palco. Jogo de pernas e vivacidade, como se soubesse o que se passa com ela (Lulu) e ao seu redor, mas que se deixa cair nas malhas do insidioso Brian (Celso Júnior, melhor do que nunca, maduro), prostituindo-se.
Os dois rapazes são Robbie (Rodrigo Frota), o personagem menos esboçado – talvez por ser o menos bad-boy-, mas ao qual o ator empresta uma certa vivacidade, fair-play e doçura. Mark – alter ego do autor já que tem o mesmo prenome? – vai para um reformatório se livrar da heroína e descobre que as pessos são como drogas, geram dependência. É dos três o que vai mais longe no radicalismo de sua viagem e e, talvez por isso, o ator Edward Passos, cara e jeito de bom rapaz, tenha dificuldade de encarnar o personagem, e só se redima quando mostra o seu lado terno.
ESSENCIA HUMANA - Em certos momentos, no entanto, o trio inicial não deixa de refletir a essência humana, o tribalismo que floresceu nos anos 60, 70 e até mesmo no início da década de 80: Lulu ama um dos rapazes, que ama o outro, que, por sua vez, vai se apaixonar pelo quarto elemento, o adolescente. Mas é um amor de tensões e sobressaltos, rondados, mais que nunca, pela violência, marginalidade e...ganância.
Aparece Gary, o muito moço Emiliano D´Ávila, com uma aura de inocência que lembra o Vladimir Brichta dos primeiros tempos no palco. Magnetismo a mil. Faz um michê, um garoto de programa que traz uma tara secreta, que explode espantosamente no final.
O diretor Fernando Guerreiro volta a dar um salto criativo e mostra que, quando quer, consegue estampar toda sua inquietação, que também é a nossa, transformados meio em humanos, meio máquinas. Todos partícipes e vítimas da sociedade que o pensador Jean Baudrillard chamou de simulacro. Como diz ironicamente o personagem de Celso Júnior, ensinando didaticamente aos outros:”Civilização é dinheiro. Dinheiro é civilização”.
Não à toa o cenário é um enorme conversível a dominar praticamente todo o palco, signo da tecnologia que nos corrói.
Clodoaldo Lobo
Jornal A Tarde, sábado, 05 de maio de 2007
Caderno 2
Um comentário:
ainda estou chocada.../
é um universo muito diferente do meu, mas acho super positivo discutir ele da forma séria como este grupo capitaneado por fernando guerreiro fez.
vcs estão de parabéns e VIDA LONGA A PEÇA!!!!!!!!!!!!!!
assisti ontem!!
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